Waldemir Barreto/Agência Senado Thiago Resende e Matheus Teixeira/Folhapress -
Ex-juiz
e ex-ministro da Justiça, o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) culpa
o governo do presidente Lula (PT) pela decisão do TSE (Tribunal
Superior Eleitoral) que cassou o mandato do deputado Deltan Dallagnol
(Podemos-PR). O PT moveu a ação contra o ex-coordenador da Lava Jato.
"Eu
respeito os tribunais, o TSE, os ministros, o entendimento deles e isso
tem que ser discutido nos meios recursais próprios. Agora, existe um
contexto que a gente não pode ignorar, que é um contexto de perseguição à
oposição", afirmou o senador em entrevista.
Para
Moro, os ministros da corte fizeram uma interpretação incorreta da Lei
da Ficha Limpa. Além de divergir da decisão, ele criticou a postura de
aliados de Lula.
"Não
tem motivo para comemorar. O governo tem insistido na polarização como
estratégia política, que é a mesma estratégia que se criticava no
governo anterior. Então o que mudou? Mudou apenas o chicote de mão? Ou a
gente vai trabalhar realmente para construir um país que é para todo
mundo e vamos respeitar as divergências políticas?", questionou.
Apesar
da decisão do TSE contra Deltan, o ex-ministro declarou estar tranquilo
em relação ao próprio mandato e lembrou que, no fim do ano passado, a
corte, por unanimidade, manteve a validade de sua candidatura.
PERGUNTA - Qual sua avaliação sobre a decisão do TSE?
SERGIO
MORO - Eu lamento a decisão. Eu divirjo dela respeitosamente. É uma
pena. Eu acho que perde o Brasil e perde a política, mas espero que o
próprio TSE ou STF possam eventualmente rever a decisão.
No
fundo, eu coloco a culpa no governo, porque o PT e o governo vêm
construindo esse clima no Brasil de continuidade da polarização. Então, o
tribunal aplicou a lei, acho que fez uma interpretação incorreta da
lei, não a melhor. Mas, no fundo, é esse contexto de cassação, de
ameaça, de censura, isso não faz bem para o país.
A
ação contra Deltan foi movida pelo PT, mas a decisão foi tomada por
sete juízes, sendo que três foram indicados pelo ex-presidente Jair
Bolsonaro.
S. M. - Eu respeito os
tribunais, o TSE, os ministros, o entendimento deles e isso tem que ser
discutido nos meios recursais próprios. Agora, existe um contexto que a
gente não pode ignorar, que é um contexto de perseguição à oposição. Em
qualquer governo, há as pessoas que apoiam o governo e tem a oposição.
Temos que discutir projetos, mas o grande problema é que o governo e o
Lula, em particular, têm contribuído com discurso que não pacifica o
país.
O sr. acredita que o PT e aliados do governo articularam a favor dessa decisão para cassar o Deltan?
S.
M. - Eu não posso comentar sobre fatos que eu não conheço. Eu vi a
decisão. E esse clima provocado pelo governo Lula que favorece a
perseguição da oposição dificulta até que uma decisão como essa, que é
controvertida, seja bem acolhida.
Deltan
disse que os corruptos estão em festa com a decisão do TSE, inclusive o
ministro Gilmar Mendes, do STF, e o deputado Aécio Neves (PSDB). O sr.
concorda com essa declaração?
S.
M. - O que eu vi foram manifestações de agentes políticos, de pessoas
comemorando a cassação do mandato. Não vi nenhum posicionamento do
ministro Gilmar Mendes a esse respeito. Eu vi, sim, alguns políticos
comemorando. Falta um pouco de humanidade. Podem não gostar do deputado,
mas o deputado sofreu uma cassação de mandato, frustrando aí 344 mil
eleitores. Não tem motivo para comemorar.
O
governo tem insistido na polarização como estratégia política, que é a
mesma estratégia que se criticava no governo anterior. Então o que
mudou? Mudou apenas o chicote de mão? Ou a gente vai trabalhar realmente
para construir um país que é para todo mundo e vamos respeitar as
divergências políticas?
O sr. diz que houve uma inovação na decisão do TSE. Se essa posição for mantida, qual deve ser o efeito disso?
S.
M. - Pode criar um precedente para os mandatos dos parlamentares diante
do Conselho de Ética. Hoje, objetivamente, a gente tem que, se um
parlamentar renunciar durante um processo aberto no Conselho de Ética,
ele é alcançado pela Lei da Ficha Limpa. Como é que vai ficar agora? Se
ele renunciar numa perspectiva de ter um processo, ele fica inelegível?
Gera insegurança, porque são situações similares.
Eu
respeito a decisão do TSE, mas divirjo respeitosamente, gera
insegurança. Se isso for aplicado, como é que fica no Senado e na
Câmara? Qualquer parlamentar que ficar sujeito amanhã a um processo no
Conselho, se renuncia antes, ele está inelegível? Não me parece que é a
melhor interpretação.
Acha que haverá pressão ou necessidade de mudança na Lei da Ficha Limpa?
S.
M. - Não creio que seja o caso de rever a Lei da Ficha Limpa. O que
existe foi uma interpretação num caso específico. Eu acho que é muito
prematuro para se falar nisso [revisão da lei].
Adversários e críticos dizem que o sr. também contribuiu para esse clima de polarização.
S.
M. - De forma nenhuma eu vejo dessa forma. Quem foi processado na Lava
Jato recebeu suborno ou pagou o suborno. São decisões que foram
inclusive mantidas pelos tribunais recursais da 4ª região, foram
mantidas pelo STJ [Superior Tribunal de Justiça]. O que houve depois foi
uma revisão, uma revanche contra esse combate à corrupção que eu
lamento, mas eu nunca tratei essas questões do ponto de vista pessoal.
Jamais
fiz qualquer manifestação minha comemorando, por exemplo, um infortúnio
de alguém na época da Lava Jato. O que existiu ali, podem dizer o que
quiserem, foi a aplicação da lei. O grande problema é que esse não é um
assunto do dia. Nos meus discursos do Senado, eu não falei de tríplex,
eu não falei de sítio em Atibaia. A gente está focado no presente e no
futuro. Esse tem que ser o foco do governo, e não o revisionismo do
passado.
O sr. se sente, de alguma maneira, ameaçado com esse entendimento do TSE diante de ações que são movidas contra sua eleição?
S.
M. - Estou muito tranquilo. O direito e os fatos estão a meu favor.
Existem duas ações no TRE [Tribunal Regional Eleitoral] do Paraná, ao
meu ver, absolutamente improcedentes [tratam de acusação de caixa 2 e de
abuso de poder econômico]. E o TSE, em dezembro do ano passado, por
decisão unânime, manteve minha candidatura.
O sr. acredita que eventual indicação de Cristiano Zanin para o Supremo seria aprovada no Senado? Qual seria a sua postura?
S.
M. - Eu só vou me manifestar quando vier a indicação. O que eu posso
apenas adiantar é que qualquer que seja o indicado o Senado precisa
cumprir o seu papel de fazer uma sabatina rigorosa, sem questões
pessoais envolvidas. Discutir realmente se o indicado preenche os
requisitos constitucionais, que são notório saber jurídico e a reputação
ilibada. E pensarmos institucionalmente o STF, o que nós queremos de um
Supremo Tribunal Federal. Queremos um STF independente.
Qual a sua avaliação sobre a gestão atual do Ministério da Justiça, pasta que o sr. já chefiou?
S.
M. - O próprio ministro [Flávio] Dino é uma pessoa qualificada, um juiz
federal, deixou também a carreira, depois foi governador. É uma pessoa
até de afável trato, mas está na hora de a gente colocar, como se diz, a
bola no chão e discutir políticas públicas com naturalidade. Esse clima
de polarização acaba prejudicando esse próprio debate.
Como está o processo de ameaças contra o sr. que foi desarticulado pela PF?
S.
M. - O grupo encarregado de fazer aqueles atos está respondendo na
Justiça, inclusive presos preventivamente os dois principais
responsáveis porque são líderes de crime organizado envolvidos no
planejamento de um assassinato. Me parece que a Polícia Federal tem
feito um grande trabalho. Aqui no Senado nós apresentamos um projeto,
que foi aprovado, que preenche uma lacuna legal importante: criminalizar
o planejamento de ataques do crime organizado a autoridades públicas.
O
sr. fala muito sobre tornar o debate público mais saudável e, para
isso, um passo é reconhecer quando os adversários acertam. O sr. vê
algum acerto do atual governo nesses primeiros meses de governo?
S.
M. - A manutenção desse clima de polarização tem, no fundo, gerado
prejuízos para uma avaliação correta e isenta dos fatos e muitas vezes
essas políticas públicas têm sido obscurecidas pelos desacertos. A gente
vê por exemplo a tentativa de revogação do novo Marco Legal do
Saneamento. Isso gera tensão com o Congresso, isso gera tensão com a
sociedade e as ações positivas do governo acabam ficando obscurecidas
por essas ações que são muito mais ruidosas.
Se a votação sobre o arcabouço fiscal no Senado fosse hoje, o sr. votaria contra ou a favor?
S.
M. - Hoje provavelmente votaria contra. Eu particularmente discordo da
forma como foi feito. Acho que ele é frouxo. No fundo é um projeto que
gera um expansionismo fiscal, quando a medida correta na minha opinião é
o corte de gastos e assim a gente consegue entrar numa linha de
declínio dos juros para ativar a economia e a gente crescer
principalmente pelo investimento privado.
RAIO-X | SERGIO MORO
Hoje
filiado à União Brasil, foi juiz na Operação Lava Jato e condenou Lula
em 1ª instância no processo que depois levou o agora presidente à
prisão. Abriu mão da magistratura para ser ministro da Justiça e
Segurança Pública no governo Bolsonaro. Deixou a pasta após 16 meses
acusando Bolsonaro de tentar interferir na Polícia Federal. Moro foi
declarado parcial pelo STF em sua atuação nos processos de Lula e teve
suas decisões anuladas. Tentou se viabilizar como candidato à
Presidência da República na eleição de 2022, mas acabou eleito para o
Senado pelo Paraná. Se reaproximou de Bolsonaro no pleito de outubro.
Fonte: BNews
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