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O Padrão Típico de Corrupção: Confira como é realizado os desvios do dinheiro público pelo Brasil a fora

O padrão de corrupção identificado em Ribeirão Bonito é típico da grande maioria das cidades do Brasil. Em vez de procurar cumprir suas promessas eleitorais em benefício da população, um corrupto eleito usa essas mesmas promessas para beneficiar amigos e parentes, para favorecer aqueles que colaboraram com suas campanhas ou para privilegiar alguns comerciantes “amigos” em detrimento de outros.
Uma boa parte do orçamento do município é orientada em proveito do restrito grupo que assume o poder e passa a se beneficiar dos recursos públicos da cidade. O meio mais comum para a prática de desvios de recursos públicos é o uso de de notas fiscais fictícias ou “frias”, que são aquelas nas quais os serviços declarados não são prestados ou os produtos discriminados não são entregues.
A burla pode ser feita com as chamadas empresas-fantasmas, ou seja, que inexistem física ou juridicamente, ou então que existem em nome de um “laranja”, que não sabe o que acontece. Como a nota fiscal passou a ser a base de toda transação comercial no Brasil, foi criada uma indústria de venda de “notas frias” desse tipo de empresa.

Existem organizações criminosas com atuação a nível estadual e até nacional que dispõem de um arsenal de empresas-fantasma para utilizar em diversas situações.
Mas a fraude também utiliza empresas legalmente constituídas e com funcionamento normal. Com o conluio dos administradores públicos cúmplices do “esquema”, tais empresas vendem ao município produtos e serviços superfaturados, ou recebem na contra-apresentação de notas que discriminam serviços não executados e produtos não entregues.
Em muitos casos produtos de roubo de carga são utilizados para simular a entrega de produtos para a merenda escolar. Tais fornecedoras ou prestadoras de serviço agem mediante acordo preestabelecido com o Prefeito e/ou seus assessores. As empresas emitem notas fiscais e a Prefeitura segue todos os trâmites administrativos de uma compra normal. Quando é necessária uma licitação, monta-se todo o procedimento de forma a dirigir o certame para uma empresa “amiga”, dificultando ou impedindo a participação de outras.
Os falsários já têm no seu cadastro diversas empresas para participar ficticiamente da tomada de preços ou da licitação. Eles forjam os documentos de todas elas, às vezes utilizando a mesma impressora, os mesmos formulários e até as mesmas máquinas de datilografia.
Emite-se o recibo de entrada da mercadoria, empenha-se a despesa, e emite-se o cheque para o pagamento. Posteriormente, o montante é dividido entre o fornecedor e os membros da administração comprometidos com o esquema de corrupção.
Em geral, os recursos obtidos dessa maneira chegam ao Prefeito e aos que participam do esquema na forma de dinheiro vivo a fi m de não restar vestígio da falcatrua.
Os corruptos evitam que tais recursos transitem pelas suas contas bancárias, pois seriam facilmente rastreados por meio de uma eventual quebra de sigilo bancário.
Para serviço que foi realmente prestado e teria um determinado custo, registra-se na nota fiscal um valor maior. Nas licitações o processo de superfaturamento se dá com cotações de preços dos produtos em valores muito superiores aos de mercado. Nos dois casos, a diferença entre o preço real e o valor superfaturado é dividida entre os fraudadores.
Notas preenchidas com uma quantidade de produtos muito superior àquela realmente entregue são outra maneira de fraudar a Prefeitura.
Nessa modalidade, os valores cobrados a mais e que constam da nota emitida são divididos entre os “sócios”. Diferentemente do superfaturamento de preços que exige uma combinação entre fornecedores, o superfaturamento de quantidades só depende do conluio de um fornecedor com o pessoal da Prefeitura que atesta o recebimento.
Esses tipos de fraude requerem, invariavelmente, a conivência de
funcionários da Prefeitura – o responsável pelo almoxarifado deve sempre dar quitação do serviço realizado ou da mercadoria entregue e a área contábil tem que empenhar a despesa e pagar as notas, emitindo o cheque correspondente. Quando se trata de serviços técnicos (como, por exemplo, os de eletricidade, construção civil e hidráulica), a execução deve ser certificada por funcionários capacitados, normalmente um engenheiro ou técnico. Assim, quando há irregularidade, todos são coniventes, mesmo que por omissão. É praticamente impossível para o Prefeito fraudar a Prefeitura sozinho, mesmo nas formas mais simples de tomada de preços e convite.
A Comissão de Licitações da Prefeitura é obrigada a habilitar as
empresas. Segundo a lei no 8.666/93, estas devem estar “devidamente cadastradas na Prefeitura ou atenderem todas as condições exigidas para cadastramento”. Para se cadastrarem, há uma série de pré-requisitos que as empresas devem preencher e documentos que precisam apresentar. Dessa forma, no caso de empresas fantasmas, é impossível que saiam vencedoras de uma licitação sem a participação ou conivência da Comissão de Licitações da Prefeitura. É muito fácil verificar se uma empresa existe ou não. Por isso não há justificativa para que essas
empresas fantasmas sejam habilitadas a participar de concorrências.
O advento das notas fiscais eletrônicas é um fato importante, pois proporciona elementos de controle antes inexistentes. As fraudes ainda podem acontecer e notas frias podem ainda ser emitidas, mas estas novas tecnologias dificultam um pouco, e também evitam o truque tão comum entre os falsários de queimar os livros e fazer um boletim de ocorrência para esconder as provas dos crimes. A apresentação dos livros de forma digital também representa um grande avanço no controle da corrupção e facilita o cruzamento de dados e a identificação da atuação do crime organizado.
Mesmo assim, as quadrilhas têm aperfeiçoado as suas formas de atuar. Por isso é preciso que os controles por parte da sociedade também se aprimorem. Como foi observado no caso de Ribeirão Bonito, o Tribunal de Contas do Estado tende a verificar somente os aspectos formais das despesas, ou seja, somente se consta a nota fiscal. Esse órgão fiscalizador não entra no mérito; se a nota fiscal contabilizada é “fria” ou não, se a empresa é “fantasma” ou não, se o valor é compatível com o serviço ou não e se o procedimento licitatório foi montado e conduzido adequadamente ou não. O Tribunal de Contas só examina tais questões quando colocadas de maneira específica. Contudo, mesmo que os aspectos formais examinados sejam irrelevantes frente à grosseira falsificação de documentos verificada em muitas Prefeituras do país, os Tribunais de Contas mantêm os seus procedimentos. Como na maioria das vezes os aspectos formais são observados cuidadosamente pelos fraudadores, o Tribunal, ao aprovar as contas do Município, passa atestado de idoneidade ao corrupto. A primeira coisa que o corrupto faz é divulgar amplamente na imprensa local que o Tribunal de Contas aprovou as suas contas; às vezes eles mandam imprimir edições especiais de jornais somente para divulgar esse fato. Esse falso atestado de idoneidade dado por um Tribunal de Contas a um corrupto
é uma das grandes razões da predominância de Administrações Municipais corruptas no país; se esses órgãos fizessem o trabalho que precisa ser feito, a corrupção hoje estaria controlada.
Na forma como atuam hoje os Tribunais de Contas não só não contribuem para o fi m da corrupção, como a estimulam. É preciso haver uma mudança signifi cativa em sua forma de ação, para que se tornem uma força contra a corrupção. Os tribunais mais atuantes contra os desvios o fazem por força das qualidades pessoais de alguns de seus integrantes e não pelos requerimentos institucionais. Todos sabemos que o critério de indicação dos conselheiros é político, e os favores são pagos com a aprovação das contas dos correligionários. É por isso que ganharam o apelido de “Tribunais de Faz de Conta”.
Um crime hediondo, entendido como aquele de maior potencial
ofensivo, que causa maior aversão à coletividade, é o que acontece com o fornecimento de alimentos para a merenda escolar em algumas regiões do país. Muitas vezes, os produtos que chegam não seguem nenhuma programação e muito menos qualquer lógica nutricional.
Nem as merendeiras sabem, em alguns casos, o que será servido aos alunos. A escolha dos produtos que serão entregues às escolas é, na realidade, feita pelos fornecedores e não pelos funcionários. Não raramente os fraudadores estão ligados a quadrilhas de roubo de cargas, e entregam nas creches os produtos disponíveis, fruto do roubo de cargas, daí a grande variação no cardápio.

Por Amarribo Brasil

 

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