MPF denuncia ex-prefeito de Boquira (BA) e envolvidos em cooperativa de fachada pelo desvio de R$ 497 mil do Fundeb
O
Ministério Público Federal (MPF) apresentou à Justiça Federal denúncia
contra Edmilson Rocha de Oliveira, ex-prefeito de Boquira (BA) e mais
três pessoas envolvidas nas operações da Cooperativa de Transporte
Alternativo do Sul e Sudeste da Bahia (Transcops). Eles são acusados do
desvio de pelo menos R$ 497.133,68 em recursos do Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) destinados para o transporte
escolar do municípioAlém
do prefeito, foram denunciados José Lino Souza, representante da
Transcops, Ana Karoline Adolfo da Silva, presidente formal da Transcops,
e Antônio Cosme da Silva, controlador oculto da pseudocooperativa. A
denúncia foi apresentada em dezembro do ano passado, e busca a
condenação com base no Decreto-Lei nº 201/67 (art.1º, inciso I), com pena de reclusão de 2 a 12 anos.
O
crime foi realizado entre 2011 e 2012, durante o mandato de Edmilson,
com participação ativa dos denunciados. De acordo com o MPF, todos
agiram em conluio para que a Transcops – uma cooperativa de fachada, que
em realidade intermediava mão de obra de terceiros – fosse a vencedora
da licitação nº 006/2011, e assim firmasse contrato no valor de R$
2.162.442,32 com a prefeitura para prestação de serviços de transporte
escolar, resultando no recebimento de valores superfaturados e no desvio
de recursos federais.
Entenda o caso - A
investigação do crime foi iniciada após o MPF receber representação da
entidade Amigos Associados de Boquira, que noticiou irregularidades na
contratação da Transcops. O MPF apurou diversos indícios que apontaram
para a fraude da licitação: o aviso de licitação foi publicado em
29/12/2010, em plena época de festividades; o processo de licitação não
continha pesquisa de preços nem termo de referência; o edital foi
colocado “à venda” por R$ 500 e continha diversas cláusulas ilegais que
visaram restringir a participação de empresas e cooperativas no pregão,
como: capital social de no mínimo R$ 600 mil – quando a lei prevê 10% do
valor estimado para o contrato – ou seja, R$239 mil; histórico de
prestação de serviço de transporte escolar de no mínimo 5 anos sem
qualquer justificativa, requisito que sequer a Transcops cumpria, porque
fora constituída em 22.08.2007 e, por isso, deveria ter sido
inabilitada.
A
Transcops, vencedora do certame, não tinha nem sequer os requisitos
definidos no edital, entretanto o ex-gestor firmou contrato com a
cooperativa no valor de R$ 2.162.442,32. Outro fato que chamou a atenção
do MPF foi o aumento de mais de 100% no valor do contrato firmado entre
o então prefeito e a Transcops ao longo de três anos. Em 2009, o
contrato foi de R$ 1 milhão; em 2010, o valor contratual foi de R$ 1,5
milhão; e no terceiro ano, em 2011, o valor firmado ultrapassou R$ 2
milhões. De acordo com o procurador da República Adnilson Gonçalves,
autor da ação penal, “na medida em que os denunciados se sentiram
‘confortáveis’ e ‘confiantes’ no cometimento do crime, os valores dos
contratos aumentaram a fim de permitir o desvio de recursos públicos em
volume ainda maior”.
Superfaturamento – A
comparação das propostas de preço apresentadas pela Transcops nas
licitações de 2009 e 2011, e das planilhas de estimativa de custo de
município, permitiu ao MPF concluir que houve deliberada e criminosa
adulteração das distâncias em linhas e rotas idênticas de transporte,
que seriam cobertas pelo mesmo tipo de veículo nos mesmos turnos. A
adulteração dos dados tinha como objetivo impor o sobrepreço no valor
total da licitação e superfaturar, mês a mês, o valor pago à empresa.
Pseudocooperativa - A
conforme investigação conduzida pelo MPF, a Transcops é uma
“pseudocooperativa” ou “cooperativa de fachada”, constituída para
mascarar a relação existente entre ela e os indivíduos apontados como
“cooperados” em cada um dos municípios em que a entidade firmava
contrato para a prestação de serviços de transporte escolar. Os
dirigentes da Transcops já respondem a ações penais propostas pelo MPF
por terem praticado atos semelhantes nos municípios de Caetité, Ribeirão o Lago e Encruzilhada.
A
pessoa jurídica não tinha “cooperados” com a Carteira Nacional de
Habilitação (CNH) do tipo D, exigida para serem motoristas de transporte
escolar – muitos nem sequer possuíam CNH de qualquer categoria. A
cooperativa também não tinha frota de veículos compatível com o serviço
para que foi contratada. Na prática, a Transcops contratava os
motoristas no local da prestação dos serviços, sem qualquer vínculo de
cooperativismo, sendo que estes tinham que arcar com todos os custos e
responsabilidades pelo serviço, mas sem participação nos “lucros”.
Denúncia - As
investigações apuraram que o então prefeito foi beneficiado pela
contratação ilegal e pelos pagamentos superfaturados, recebendo valores
em espécie, ou por meio de empresas de sua família ou servidores da
prefeitura. Edmilson já responde à ação de improbidade movida pelo MPF em 2018 pelo desvio dos recursos do transporte escolar.
Na ação penal, ele é denunciado não apenas pelos benefícios recebidos,
mas também por: autorizar e aprovar o edital irregular sem submeter este
documento ou o contrato à análise da procuradoria jurídica do
município; restringir a competitividade da licitação; homologar a
licitação ainda que a Transcops não atendesse aos requisitos legais; e
assinar o contrato e autorizar os pagamentos superfaturados e com
medições fraudadas à cooperativa de fachada.
O
coordenador de transporte escolar da Transcorps, José Souza, participou
ativamente do desvio dos recursos, preenchendo e apresentando as
planilhas adulteradas diretamente a Edmilson, não fiscalizando o serviço
da cooperativa e assinando a ata de participação do pregão nº 006/2011
mesmo não estando presente na sessão. Além disso, sua esposa recebeu
inúmeras transferências bancárias no ano de 2011, valores esses
movimentados por José.
Ana
Karolina, que também foi beneficiada com parte dos recursos desviados,
servia como “escudo” para seu pai, Antônio Silva, também denunciado, e
cujas provas revelaram ser o mentor do esquema em diversos municípios, e
o responsável pela combinação dos desvios com os gestores, embora
procurasse ocultar sua vinculação com a presidência da cooperativa.
Ocupando a presidência da Transcops, sua filha assinou planilhas de
preço com as distâncias dos percursos fraudadas para obter valores
superfaturados, além de assinar o contrato e diversos outros documentos
em nome da pseudocooperativa.
Condenação- O MPF requer da Justiça a condenação dos denunciados pelo crime de responsabilidade de prefeitos e
a reparação de, pelo menos, R$ 497.133,68, valor correspondente ao
superfaturamento comprovado, com a devida atualização monetária.
MPF empreende esforços para a melhoria do transporte escolar na Bahia - Em
7 de fevereiro deste ano o MPF realizou audiências pública em Guanambi
com prefeitos e a população de diversos municípios da região para
discutir melhorias do transporte escolar, coibir más práticas e
aprimorar o modelo de contratação do serviço. Em dezembro de 2018, o MPF já havia realizado audiência semelhante em Bom Jesus da Lapa. Em 2018 o órgão havia encaminhado recomendações aos municípios da área de abrangência do MPF em Bom Jesus da Lapa, Guanambi, Barreiras e Ilhéus.
Em
2019, o MPF firmou diversos Termos de Ajustamento de Conduta (TACs)
para aprimorar o transporte escolar no interior baiano, entre eles os
municípios de: Cocos, Serra do Ramalho, Coribe, Bom Jesus da Lapa,
Brotas de Macaúbas, Igaporã, Feira da Mata, Riacho de Santana, Santa
Maria da Vitória, Paratinga, Canápolis, Correntina, Ibotirama, Floresta
Azul, Gandu, Piraí do Norte, Presidente Tancredo Neves e Wenceslau
Guimarães. No mesmo ano o MPF realizou, ainda, ações de fiscalização em
parceria com a Polícia Rodoviária Federal em Guanambi, Sítio do Mato, Santa Maria da Vitória, São Félix do Coribe, Correntina e Serra do Ramalho,,para
verificar as condições de prestação do serviço de transporte escolar.
Os órgãos constataram várias irregularidades, como motoristas sem
habilitação, veículos sem placas e com passageiros acima da sua
capacidade.
O
procurador alerta: “as fiscalizações vão continuar. O gestor que
resistir a se ajustar ao modelo legal de contratação e execução do
serviço de transporte escolar poderá ser responsabilizado”.
Assessoria de ComunicaçãoMinistério Público Federal na Bahia
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